quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Que a chuva traga alívio imediato

As mãos de Ana suavam ao esperá-lo, e ela parecia uma adolescente de 13 anos. Recordava todas as conversas e pensava no jeito dele, em como ele tinha alguma coisa de singular, alguma coisa que a encantava, e nos seus olhos azuis da cor do céu. Ela nem acreditava que o encontraria mais uma vez, pela primeira vez - sim, era como se fosse a primeira vez, mas não era. Seu coração -presa fácil pra crueldade desse tipo de sentimento- sabia que não poderia esperar nada, mas isso não importava naquele momento. Porque tudo que importava era exatamente o momento. Pessoas passavam, iam e voltavam na estação do metrô. Ana permanecia sentada no banco, tentando se distrair com a leitura de um livro, mas não conseguia se concentrar, porque tinha borboletas no estômago - e como eram boas aquelas borboletas. Ana esperava.
Pablo estava a caminho, queria encontrar Ana, a achava bonita e simpática, uma companhia que o distraía e até mesmo fazia com que conseguisse esquecer Mariana por alguns instantes. Pablo havia terminado o relacionamento com Mariana fazia alguns meses, e como já era de se esperar, seu coração definitivamente não estava disponível, mas seria bom encontrar Ana novamente, afinal, ela era espontânea, agradável e o fazia esquecer dos problemas. Pablo era tímido e talvez também estivesse um pouco nervoso, mas Ana não notaria, porque certamente ela estava bem mais nervosa.
Após 3 trens, aquele que trazia Pablo finalmente chegara à estação. Ana estava com a cabeça baixa, olhou rapidamente para o lado e ali estava ele, lindo como um deus grego...vindo em sua direção. Ela fez alguma brincadeira na tentativa de espantar sua própria tensão, e eles se cumprimentaram. Pablo era tímido e isso encantava Ana. Abraçaram-se e caminharam de mãos dadas, enquanto conversavam. Quer dizer, Ana falava e falava, porque sempre que ela ficava nervosa falava demais (mais do que normalmente). Eles não conseguiam se encarar por muito tempo. Ana por ansiedade e Pablo por timidez. Mas era mágico cada vez que seus olhares se encontravam, assim, rapidamente, durante segundos que ficavam eternizados...era mágico, para Ana. Foi mágico passear pelo parque de mãos dadas. Foi mágico quando a chuva começou e eles procuraram um lugar pra se abrigar entre as árvores. Foi mágico quando Pablo colocou seu casaco em volta de Ana 'para que ela não se molhasse tanto', e ela o abraçou. Ele a abraçou de volta. A chuva ficou mais forte. Eles andaram mais depressa em busca de uma cobertura, até que acharam. Até que os olhos dele decidiram pousar sobre os dela, e ficaram ali, esquecidos e encontrados. Até que o beijo aconteceu. O segundo beijo. Desde aquela noite em que se conheceram naquela festa. Não havia música, haviam pessoas, adultos e crianças, que também fugiam da chuva. Mas no pensamento de Ana, uma música tocava, sendo a trilha sonora daquele momento. Ela sabia o quanto aquele dia, aqueles momentos e aquele rapaz que a encantava eram fugazes. Mas nada disso importava agora. 
O tempo passou. Ana sabia desde o início que o coração de Pablo não estava livre para ela, mas mesmo assim, entregou-se aos seus encantos. Quando tudo isso começou ela tinha a opção de não levar adiante, de não manter contato com ele e hoje em dia seria apenas um desconhecido que ela encontrou numa noite qualquer e nunca mais viu na vida. Mas ela escolheu colocá-lo em sua vida, mesmo sabendo que não era ali que ele iria ficar, mesmo sabendo que ele não poderia seguir o caminho dela, seguir com ela. Ela decidiu correr o risco, como sempre. Tardes como aquela nunca mais aconteceram. Nunca mais vão acontecer.
Ana não era mais uma menina, há muito tempo, há muitos anos. Mas Ana sempre foi boba, uma dessas bobas que volta e meia se encantam com a singularidade de alguém. Passariam-se dez, vinte anos, e ela continuaria sempre assim, sendo boba, sendo sensível.
O distanciamento era inevitável diante das circunstâncias. E disso ela sempre soube. Agora, na solidão do seu quarto, o que antes não importava passou a pesar. Ela compreendia perfeitamente que Pablo e ela não estavam exatamente no mesmo momento, embora ela tivesse passado por uma experiência semelhante - ela já estava curada, fazia mais tempo. Ele não, tudo era recente demais. Ela compreendia isso. Quer dizer, a razão compreendia. Todo o resto dela teimava em não entender. Mesmo sabendo que era culpada. Que quem deu início a um jogo que não precisaria ter existido foi ela.
Temporais como o daquela tarde, existirão muitos, mas nunca serão iguais. Pablo tinha cabelos da cor do sol. Ana tinha uma tempestade no coração. E ela só queria que o sol voltasse a nascer. Ou que a chuva trouxesse o alívio de que tanto precisava. E dentro dela, havia a certeza de que a lembrança daquela tarde chuvosa ficaria para sempre.


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Continua...

Um comentário:

Ellen Visitário disse...

Eu tenho um coração eufórico igualzinho o de Ana.
E eu espero que este Alívio Imediato bata em minha porta também.

Parabéns pelo conto, Mari!Lindo! E cada vez melhor!

Beijão!