quarta-feira, 6 de novembro de 2013

No inverno fica tarde mais cedo

Chovia e eu decidi caminhar por aí sem rumo. Observava o céu se enegrecer como o meu coração. O céu, que durante todo o dia havia permanecido cinza. Como o meu coração. Deixei que a chuva caísse sobre o meu corpo. Eu não tinha porque fugir dela. Havia coisa mais grave da qual eu, sem muito esforço para tanto, não havia conseguido escapar mesmo. Eu me senti como uma peça num jogo de xadrez, movida por uma força maior que tentava me descartar, mas eu teimava e me esforçava pra permanecer no jogo. Eu não sabia que era um jogo.
Hoje tudo está tão claro, ao contrário desse céu que está sobre mim. Não há guarda-chuva que proteja quando ela cai, impiedosa, e te acerta. E ela machuca. Nem mesmo sei como denominá-la. Sei que um dia é paraíso, no outro é inferno. Sei que escurece rapidamente, como um fim de tarde no inverno. Sei que queima, mas não aquece. Sei que, assim como a rua na qual caminho agora, tudo o que fica é um deserto e um silêncio quase mórbido.
Não é irônico que aquilo que você busca pra te preencher te deixe tão vazio no final? O final. É tudo que eu desejo agora, que essa loucura tenha fim. Que a chuva lave minha alma e leve toda impureza de um coração enegrecido. Vou trancá-lo a sete chaves e jogá-las fora, por diferentes cantos do mundo, um bem distante do outro.
Deitado em minha cama, ainda sinto a chuva. Nuvenzinha negra pairando sobre a minha cabeça, que cochicha em meus ouvidos que o fantasma ainda não se foi. Fantasmas não são possíveis de se enxergar e não te fazem companhia. Fantasmas só assustam e angustiam. Mas, nessa noite chuvosa de inverno em minha vida, nessa noite que parece que não tem mais fim, uma única certeza me consola: fantasmas não existem. Só espero que meu coração não leve tanto tempo pra perceber isso.
É tarde, o sono não vem. Taças de vinho são testemunhas das minhas dúvidas que, por medo, tanto hesitaram para se afirmar certezas. Mas não teve jeito, elas me sufocaram, então eu tive que obrigá-las a sair de mim ou não conseguiria mais respirar. Elas saíram, em forma de palavras, palavras verdadeiras, sinceras como não se pode ser. Ia doer de qualquer forma, eu precisava respirar. Respirando, eu saberia que iria sobreviver. Mais uma vez.
Eu perdi a direção, e o caminho que por um tempo segui confiante se tornou um labirinto. E o céu enegreceu. No inverno fica tarde mais cedo. E eu havia me esquecido que era inverno em minha vida, que a primavera demoraria a chegar, e me precipitei: choveram sentimentos indevidos pros quais eu não tinha preparo. O fogo ilumina muito por muito pouco tempo. E era fogo o que eu achava que era a luz do sol. Era só uma chama que a chuva apagou. Já é tarde e está escuro. E eu espero acordar, tão depressa e poder deixar o sol entrar. Nem que seja pela porta que você deixou aberta ao sair.
E que tudo não passe de lembranças vagas de um passado que passou.