quinta-feira, 26 de abril de 2012

Curvas na Estrada, Pedras no Caminho

Sem olhar para os lados, sem se importar com o que viesse de qualquer direção, o pensamento já havia ido longe demais pra que pudesse ter ainda alguma noção de onde estava e o que fazia. A falta de sentido, de senso, de discernimento sobre o que a havia levado até onde se encontrava agora resultava nesse completo transtorno, num caos mental que não se podia descrever. Tão subitamente sente uma força que surgiu do nada no meio daquela rodovia e viu sua vida passar diante dos seus olhos por segundos, enquanto essa mesma força a atirava ao chão, no acostamento. 
- Salvei sua vida, me agradeça. Esse era dos grandes, hein. - disse ele, esboçando um leve sorriso irônico, agarrado a ela no chão entre escoriações e o susto.
- Você, sempre você! - ela responde, se desprendendo com força de seus braços e tentando levantar-se, o que não consegue. - Não cansa de me seguir? Aparecer feito uma assombração por cada lugar por onde eu ande?
- Que tipo de idiotice você estava prestes a fazer, não é mesmo?
- Você poderia ao menos me deixar. Me deixar em paz, me deixar fazer o que eu bem entender com a minha vida. Afinal, foi você quem decidiu deixar de fazer parte dela.
Silêncio de palavras. Barulho infernal do trânsito numa tarde cinza. Ele tenta ajudá-la a levantar do chão, o que ela não permite, e se levanta sozinha.
- Por que não some de uma vez?
- Se é isso o que você quer...
- Não finja que não se importa. - alteram o tom de voz.
- Você sempre mimada. Foi você quem errou comigo, eu deveria sumir mesmo. - cruza os braços, vira-se de costas, olha pro nada.
- Obrigada por estragar meus planos. - ela o empurra enquanto passa a sua frente e segue andando.
Ele a segue.
-Pare de me escoltar! Você não vai me perdoar. Não vai voltar pra minha vida, então suma dela de vez!
Ele segura fortemente o braço dela a fazendo parar.
- Você vai me ouvir, mocinha. Nada no mundo me daria maior satisfação do que conseguir desaparecer da sua vida pro resto da minha. Sumir com todas as lembranças, com tudo que fomos e você fez deixarmos de ser. Você é tão egoísta que pensa sempre que pode reverter as coisas ao seu favor só porque você quer. Não é assim. As coisas não dependem só da sua vontade. Se você entendesse um pouco da vontade das pessoas que você diz amar, se você considerasse alguma coisa além do seu próprio umbigo, não teria agido daquela maneira estúpida e nenhum de nós estaria destruído, agora.- ele a puxa pro acostamento enquanto um veículo passa bem próximo dos dois.
- Odeio sua mania de querer me proteger. Eu não preciso.
- Odeio seu humor, seu egoísmo, menina mimada.
- Odeio você, senhor 'sempre tenho razão'.
Pausa.
Ela não tinha argumentos. Perto dele sempre se desconcertava enquanto tentava bancar a durona. Mesmo sabendo que estava errada. Perto dele, era sempre a criança mimada, teimosa, orgulhosa. 
-Quer saber? - ela diz- Eu tô sofrendo também. Isso dói em mim também. Eu não sei onde estava com a cabeça. Eu não sei onde ANDO com a cabeça. Não sei mais cair em mim. Me desconheço.
- Desculpas. Cresce, menina. Aprende a assumir suas consequências.
- Você não é ninguém pra me dizer o que fazer. - vira-se e sai andando.
Ele novamente a segue, e logo a segura. Param. Olham-se.
- Não sei porque teimo em tentar te proteger. Porque teimo em não sair da sua vida. Você não merece, menina. Mas tudo bem. -ele a solta- faça o que quiser com a sua vida, já é bem grandinha. Só não se esqueça que, embora você não mereça e não passe de uma infantil egocêntrica...eu...eu me importo com você, não quero que se machuque.
Rostos se aproximam. Lágrimas nos olhos. Perfumes se entrelaçam. Mas os olhos...os olhos não conseguem mais se enxergar além da névoa de mágoas que passou a existir entre eles. Por culpa dela. Sem destino ou qualquer outra justificativa, não havia ninguém mais a culpar além de si própria.
- Eu não mereço! - ela chora. E corre. O mais rápido que pode. Como se pudesse fugir do mundo, do julgamento das pessoas, de sua consciência,  dele...e principalmente de si mesma.
Ele permanece parado. Olhando-a ir embora, ao longe. Protegendo-a em pensamento. Como um anjo guardião, sempre ali, ainda que sua razão soubesse que não era o mais adequado a  fazer. Mesmo com o orgulho ferido, a ferida aberta, o coração partido. Uma mistura de rancor, com amor e a necessidade de deixá-la ir e enfrentar sozinha sua merecida colheita....com a vontade de permanecer, impedindo que aquela cabecinha de vento cometesse mais besteiras.
Ela tinha tanto o que crescer.



ılı.lıllılı.ıllı..ılı.lıllılı.ıllı  ♫  Here Without You - 3 Doors Down

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