domingo, 22 de abril de 2012

Portas Trancadas

Era uma garota como outra qualquer, exceto pela escassa ou nenhuma vontade de sair por aí, em direção ao mundo. Sentia-se como se voltasse à estaca zero de muitos anos atrás, mas agora era diferente. Não se tratava mais da timidez de uma garota que não conhecia nada do mundo. Do mundo ela já havia conhecido o suficiente. O suficiente pra duvidar de tudo. O suficiente pra haver se entediado. Nada mais era capaz de atrair sua atenção, de motivá-la. Há muito tempo precisava de algo que a fizesse sentir-se viva. Alguma coisa que a impulsionasse e devolvesse o entusiamo infantil da descoberta. Mas por hora, suas únicas companhias eram as paredes do quarto, as músicas, os livros.
Fecha os olhos e, ao abri-los, encontra-se numa rua qualquer. Um dia frio, vento forte, bancos de praça, árvores. Fones de ouvido a faziam sentir-se livre de tudo. Longe de tudo. Como se não houvesse ninguém mais. Afinal, ninguém mais conseguira a proeza de fazer com que ela se importasse...desde a última despedida. Lembranças vinham à tona todos os dias. Não importa quanto tempo passasse, vinham sempre com a mesma intensidade. Mas  as lágrimas já haviam empedrado. A dor era  lugar-comum. Algo com que já havia aprendido a conviver, uma velha conhecida. O pensamento vagava em direção a qualquer tempo e lugar onde tudo pudesse ter sido diferente. Onde não houvesse esse cansaço das pessoas e esse tédio interminável em relação a tudo. Viver por viver. A mesma sequência estafante todos os dias. O único desafio era encontrar uma nova motivação. Mas não se sentia disposta a lutar por isso.  Nada seria capaz de mudar o rumo das coisas. Nada voltaria a ser como antes. Tanto faz.
Tudo é sempre um mistério. Destino? Acaso? O que viria depois? Não importava. Respirou fundo. O ar que a fazia ter consciência de que, enquanto estivesse viva, algo a mais teria de fazer além das ações que se tornaram tão mecânicas e sem importância dia após dia. Algo além de simplesmente sobreviver. Mas o quê? Já não sabia mais se preferia a paz de não ter que esperar por nada, de não ter que lutar por nada ou a inquietação da busca por sentido. Tão confuso.
Abriu os olhos e, no quarto, as janelas fechadas. Luzes apagadas. TV ligada. Ilusória sensação de companhia. O mesmo desejo, tão presente, de acordar sentindo o alívio de os últimos meses não terem passado de um sonho ruim. Mas não. Lá estavam eles, todos deitados ao seu lado. O mesmo vazio. O mesmo nó na garganta. O mesmo arrependimento. O mesmo buraco no coração. Esses sim, companhias inseparáveis. E a porta fechada pro amor.



ılı.lıllılı.ıllı..ılı.lıllılı.ıllı  ♫  Why Worry - Dire Straits  

2 comentários:

Jaime Guimarães disse...

Neste caso, só mesmo o tempo...para fazer renascer o desejo de procurar outra chave.

E até o momento em que a garota resolva abrir uma janela.

:)

Unknown disse...

Muito bom essa história... Parabéns!