sexta-feira, 27 de abril de 2012

Outono em Porto Alegre

Um livro é sempre uma boa companhia de viagem. Foi assim naquela tarde meio fria e com pouco sol de sexta-feira, 13 de maio. O voo até Porto Alegre partiu por volta das dezesseis horas. A sensação de andar sobre as nuvens, quase que literalmente, era mais agradável do que na primeira vez. Os mapas do acaso ensinavam atalhos que encurtaram a viagem de uma hora e vinte minutos. Fui recebida com um belíssimo pôr de sol de tarde de outono quando cheguei.
"Onde estão teus olhos? Agora que eu tô bem na foto, agora que eu achei o foco. Onde estão teus olhos?" dizia a canção que tocava repetidas vezes na minha cabeça. Os olhos que eu esperava ansiosamente para reencontrar. Recolho minhas bagagens e, ao sair pelo portão de desembarque, lá estavam aqueles olhos. E era sempre a mesma sensação, do primeiro encontro, só que melhorada, conforme nos conhecíamos e estreitávamos o laço. Entre abraços, beijos e olhares bobos como se há décadas não tivéssemos nos encontrado, o amor. A chama acesa. O trajeto pra casa, filmes no final da noite, os sonhos divididos, compartilhados. Era como se eu morasse ao lado. Era como se bastassem alguns poucos metros pra chegar até ali.
Um sábado típico de outono. Nublado, vento frio. Família reunida e chimarrão. O jardim ao qual não poderia pertencer. A lagarta viraria borboleta e levantaria voo ao amanhecer. Mas era ainda muito cedo pra pensar em despedida.
Uma tarde, um passeio.  Um momento aparantemente simples, mas importante. Uma importante parte da história a qual você protagonizava e eu cheguei pra participar nas cenas finais. Era importante pra mim. Era só o início.
Um chopp na praça de alimentação do shopping, um brinde, música ao vivo, dois olhares, declarações, um amor. Parecia forte, parecia eterno. Cada momento era eterno, por mais simples que fosse. Como um jantar simples em família, era eterno. Uma noite juntos, num bar, brindando, encontrando amigos, jogando bilhar, era eterno. Só a despedida não era eterna. Existia sempre a certeza da próxima vez, do próximo encontro, do próximo capítulo. Eram as cenas de um filme, que até então, não tinha fim.
A borboleta levantou voo no dia seguinte. Não era flor, não poderia permanecer, não poderia pertencer ao jardim, que trouxe consigo nas fotos. Mas enquanto ele estivesse bem cuidado, ela retornaria. Enquanto o amor fosse forte o bastante contra qualquer obstáculo, ela voltaria. Haveria sempre a certeza de um próximo pouso.
Quase um ano se passou. O jardim ainda está lá, mas não há como voltar. As asas da borboleta foram cruelmente arrancadas. Não existem mais voos com destino a Porto Alegre. Não na minha vida. Agora, só terra firme. Já não ando mais nas nuvens. Ando sobre folhas secas. Em um estado distante. Em ruas ruidosas, respirando poluição, sobre concreto e asfalto, seguindo e sobrevivendo. Pé na estrada, cabeça lá na Lua. As folhas estão mortas. Mas o coração agoniza...feito borboleta sem asas.

ılı.lıllılı.ıllı..ılı.lıllılı.ıllı  ♫ No Doubt - Don't speak

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