sábado, 12 de julho de 2014

Parecia liberdade, mas era só solidão.

Apesar de seu jeito muitas vezes infantil e egocêntrico, Rafael tinha uma alma tão bonita e singular que me cortava o coração observar como a solidão de seus dias entristecia seu olhar desde a partida de Letícia. Conheci Rafael há pouco tempo (sou nova na empresa onde trabalhamos), e em meio as  nossas conversas entre um café e outro, era nítida sua confusão interna. Ele sentia falta de aproveitar a juventude da maneira como não fez, casou-se cedo, sempre fora uma rapaz tímido e isolado que agora tinha sede de viver...mas ao mesmo tempo ele amava aquela mulher como dificilmente um homem se imagina sendo capaz de amar. Ele realmente não compreendia como foi deixando que as brigas se tornassem tão frequentes, quando foi deixando de prestar atenção e valorizar as palavras e o esforço de Leticia em manter aquela relação, aliás, ela era o assunto mais comentado, sempre. E ele se culpava...sempre se culpou pela partida dela. Eu compreendia perfeitamente a atitude de Leticia. Ela tinha um espírito livre, segundo pude perceber através das descrições que Rafael fazia, e ainda assim lutou durante dez anos por aquela união. Um dia ela se cansou da atenção que ele não dava mais, da mania de achar que já a tinha nas mãos, então não precisaria mais conquistá-la dia após dia. Assim como eu não suportaria por muito tempo, ela também não suportou. E eu sempre fui sincera com ele a respeito disso. Relacionar-se requer certezas. O amor é uma certeza e não 'achismos'.
Ele sempre me trazia alguma carta ou poema, dos que fazia para ela. Sabe, era comovente ver naquelas linhas, assim como naqueles olhos, uma esperança infantil que nunca morria: a de que ela fosse voltar algum dia. Já faziam meses, mas ele tinha essa certeza e era nítido. Mas eu (como qualquer pessoa no mundo) sabia: ela não voltaria. Eu já estive lá. Na mesma situação de Leticia. A gente não volta. E não volta porque a partida definitiva só se dá após inúmeras tentativas, após relevarmos tanta coisa, após esgotarmos todas as nossas forças. E quando o adeus definitivo é dado, não olhamos para trás. É bem provável que o amor de Leticia tenha se esgotado junto com suas forças. Mas somente a esperança cega de Rafael não conseguia ver isso. E sabe-se lá quantos dez anos mais serão precisos para que ele se dê conta e então decida riscar outro fósforo e deixar que a vida o apresente outro caminho. Porque ela precisou ir embora para que ele percebesse que a liberdade que almejava era só uma solidão doída e camuflada. E ele estava perdido, completamente perdido, sem saber o que fazer sem ela. Com o tempo sobrando, entre tantas pessoas, nos bares, mas se sentindo sozinho como nunca, enquanto os dias passavam. Eu queria poder fazer alguma coisa, mas me sinto inútil. Palavras quaisquer que eu diga não produzem efeito algum. É como se eu tivesse um trabalho a fazer aqui, mas que não vai ser fácil. Talvez seja mais sensato sair de cena e deixar que o tempo cuide disso. Deixar que ele cresça com essa dor, infelizmente necessária. E enquanto ela não passa, meu ombro amigo estará sempre aqui, por essa alma apaixonada, que tanto me tem cativado.

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